Marradas de carneiro mal morto
Depois de jurar a pés juntos que se ia abster na votação do Orçamento do Estado para o ano que vem — qual monge em jejum de decisões — o Carneiro do PS afinal decidiu que já não gosta assim tanto do documento do Governo. Mudou de ideias, o homem. Deve ter olhado para as verbas e pensado: “eh pá, esturrar o dinheiro também é uma arte — e eu quero o meu quadro pendurado noutro museu”.
Nada contra. Até porque o plano dele é esturrar o dinheiro de forma mais caridosa distribuindo o bodo pelos reformados com pensões mais baixas, e ainda por cima de forma permanente. É bonito. É justo. É quase poético. Assim de repente, lembro-me de alguns ex-colegas que se reformaram aos trinta e seis anos de serviço — quando ainda se podia ir para casa enquanto o corpo aguentava o dominó — e que ficaram com a pensão mínima. Uns quinhentos e poucos euros. Uma tragédia, se não fosse o apartamento no Algarve e o T2 em Lisboa arrendado a estudantes. Mas pronto, esses merecem este mimo do Carneiro socialista, tal como merecem os outros — os que nunca descontaram um cêntimo, ou descontaram só o que não passava por baixo da mesa. Tadinhos. Há que cuidar deles, não vão um dia destes votar nos fascistas.
Os restantes, os que trabalham e descontam tudo, podem continuar a pagar e a sorrir. Quando chegar a vez deles, logo se vê. Talvez ainda consigam uma pensão que dê para pagar a luz e um pastel de nata ao fim de semana. Mas que não se queixem, que o Carneiro está a marrar com toda a força por um país mais justo. Desde que a conta venha em nome dos mesmos.
