E burka, pode-se?
Um município algarvio colocou em discussão publica um projecto de regulamento sobre condutas a adoptar na via pública pelos transeuntes. O normal. Quer a discussão, quer o conteúdo. Apesar do mesmo estar a suscitar alguns títulos jornalísticos mais sensacionalistas e reportagens noticiosas relativamente ambíguas.
O preâmbulo do dito documento coloca a ênfase nessa coisa das “novas realidades”. Parece que aquilo terá mudado muito nos últimos tempos e, segundo a autarquia, será necessário “assegurar a necessidade de enquadramento a novas realidades”. Que serão múltiplas e variadas, presumo. A questão não se resume aos biquinis, à nudez e à simulação de actos sexuais na via pública. Implica também, para além de andar em cuecas à vista de todos, a proibição de acampar ou cozinhar no espaço público. Actividades que, preveem as ditas normas de conduta, poderão ter como pena acessória a perda de apoios municipais aos prevaricadores que deles sejam beneficiários.
Contrariamente ao que aconteceu quando outros municípios se propuseram sancionar os munícipes que cometam desacatos e façam falsas declarações com a perda de subsídios e da habitação camarária, agora ninguém parece importar-se que possa acontecer o mesmo a quem monta uma barraca num jardim ou à porta dos primos nem a quem tenha por hábito utilizar o passeio para fazer o churrasco ou cozinhar o feijão. Nada que me espante muito. Afinal nestas matérias a indignação é, quase sempre, uma questão de oportunidade. E de oportunismo, também.