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Kruzes Kanhoto

Ainda que todos, eu não!

Kruzes Kanhoto

Ainda que todos, eu não!

Apedeutas alarves

Kruzes Kanhoto, 17.05.25

A ofensa da moda – nas redes sociais, pois ao vivo e a cores a coisa fia mais fino - é chamar acéfalo a qualquer um a propósito de tudo e, principalmente, de nada. Basta um scroll apressado e lá estão eles, empunhando o teclado como espada, prontos a defender a honra da sua opinião — quase sempre copiada de um meme mal traduzido — com a subtileza de um rinoceronte numa loja de cristais.

Estes novos paladinos da razão têm um insulto favorito: “acéfalo”. É a sua palavra mágica. A Excalibur do ignorante militante. Usam-na com uma frequência tal que, por momentos, somos levados a pensar que o termo perdeu todo o seu significado original. Coisa que, se calhar, desconhecem. Aliás, é de crer que muitos deles julgam que "acéfalo" é uma espécie de detergente ou suplemento alimentar.

Com uma ortografia claudicante e uma sintaxe que faria corar um tradutor automático, lá estão eles, a despejar sentenças com a solenidade de um juiz, mas com a profundidade analítica de um piropo atirado de cima de um andaime por um qualquer trolha em dia de pouca inspiração. Não discutem, sentenciam. Não dialogam, decretam. E se alguém ousa discordar, o veredicto é fulminante: “acéfalo”.

São as maravilhas da era digital. Gente que mal domina o próprio idioma, mas se sente intelectualmente autorizada a distribuir certificados de inteligência. Pessoas que mal conseguem conjugar um verbo, mas que se sentem investidas da autoridade moral de chamar ignorante ao mundo inteiro. São  semianalfabetos com delírios de Sócrates. O filósofo, não o outro, embora as semelhanças sejam irónicas.

Esses cruzados da opinião alheia não querem diálogo, querem catequese. Quem não comunga da sua fé política, desportiva ou do que mais calhar está automaticamente excomungado da inteligência, por decreto de alguém que escreve “noço” e confunde “haver” com “a ver”. E assim seguimos, navegando num mar de sapiência de rodapé, onde cada analfabeto funcional é também um pequeno inquisidor das ideias. Porque, no fim de contas, pensar dá trabalho e repetir insultos dá muito mais likes.

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