Ser solidário é uma coisabonita. E está na moda, também. Pena é que uma observação mais atenta dascausas que motivam verdadeiras ondas de solidariedade e, bem assim, daquelesque se apressam a manifestar o seu espírito solidário, constitua um exercício quepoucos fazem.
Repare-se no caso darecente condenação, pela justiça russa, das “Pussy Riot” por terem invadido umlocal de culto, alegadamente em protesto contra o governo lá do sítio,perturbando quem estava a fazer as suas rezas. Verdade que meter as mocitas nachoça durante dois anos, só por causa das cantorias manhosas num templo, queaborreceram umas quantas beatas e desagradaram aos manda chuva lá da terra é,convenhamos, um bocado exagerado. Por isso, ou por outra coisa qualquer, nãofalta gente a anunciar a sua solidariedade, pelas mais diversas formas, paracom as cantoras (!) e a manifestar a mais convicta reprovação pela actuação dasautoridades russas.
Parece-me no entanto –mas isso sou apenas eu a desconfiar - que caso o palco do protesto tivesse sidooutro, ainda que o objectivo exactamente o mesmo, a história teria contornos muitodiferentes. Nomeadamente ao nível do movimento solidário. Admitamos que asjovens teriam tido a coragem – isso sim, seria corajoso – de ir protestar parauma mesquita ou, apenas, para um local onde meia dúzia de muçulmanos estivessementretidos nas suas práticas religiosas. Se calhar, até pelos antecedentes quese conhecem, os mesmos que agora se solidarizam com as condenadas estariam ademonstrar a sua reprovação pela intolerável provocação que as mesmas teriamcometido. A solidariedade, quase de certeza, iria direitinha para a mourama eos cartazes anti-Putin, como da outra vez das caricaturas, seriam substituídos porpedidos de desculpa…
É por estas e por outrasque não suporto a gentalha dos movimentos de solidariedade. Nisto, bem comonoutras coisas, a coerência deve vir em primeiro lugar. Mas isso pareceimportar pouco àqueles que apenas querem é aparecer.