Burrice, qualidade exigida para opinar nas televisões.
Kruzes Kanhoto, 07.07.12
A decisão do tribunalconstitucional acerca do confisco dos subsídios de férias e de natal dosfuncionários públicos - dos que ganham mais de seiscentos euros por mês, porqueos outros escaparam ao roubo – tem motivado um conjunto de reacções deveras curiosas.A começar pela do governo. Como era notório estava com a batata quente dodéfice entre mãos, a necessidade de novas medidas era mais do que evidente e,assim de repente, a solução é-lhe servida sem grandes custos políticos. Esteacórdão vem permitir-lhe aumentar o saque, atirando para outros a culpa demedidas que teria, inevitavelmente, de tomar.
Depois as reacções doscomentadores que pululam pelas televisões. Uma escassa minoria revelou algumalucidez na análise, mas a grande maioria reagiu com os argumentos simplistas dequem não aprecia que lhe vão ao bolso. Pior do que isso foi o destilar deveneno contra os funcionários públicos. Quase aquele tipo de conserva, “porcausa daqueles palhaços vou eu agora ter de pagar”. Coisa que se for eu a dizer,que não passo de um alarve, não vem mal ao mundo, mas gente daquela, capaz defazer opinião – pelo menos entre os mais parolos – devia ter um bocadinho detento na língua.
As declarações apropósito deste assunto atingiram um nível de burrice verdadeiramenteassustador. Incluindo as proferidas pelo líder parlamentar do ex-partido dotáxi. Fico-me apenas por uma, entre as inúmeras que se podiam citar, que ilustrana perfeição a qualidade das elites pensantes e os conhecimentos que evidenciamacerca do país que governam ou relativamente ao qual revelam um inquietante frenesimopinativo. Para eles pode-se cortar dois meses de ordenado aos funcionáriosporque estes não podem ser despedidos, ao contrário do que acontece no sectorprivado. Os ignorantes desconhecerão certamente que na função pública existemdezenas de milhares de contratados a prazo que, tal como os restantesfuncionários, são vitimas do roubo de dois meses de vencimento. Assim derepente parece-me – se calhar é por não ter nenhum curso desses da moda – que aestabilidade de um vinculo laboral titulado por um contrato a prazo, ainda queoutorgado com o Estado, é capaz de ser ligeiramente diferente, para pior, doque um contrato de trabalho sem termo numa qualquer empresa. Mas isso sou euque, ao contrário dessa malta, ando a dizer há anos que cortar salários provocasérios estragos na economia.