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Kruzes Kanhoto

Ainda que todos, eu não!

Kruzes Kanhoto

Ainda que todos, eu não!

Tiro ao Álvaro

Kruzes Kanhoto, 30.06.12

Protestos como os queontem tiveram como alvo o ministro da economia não constituem motivo paragrandes espantos. Pelo contrário. O que surpreende é, face à tragédia quemuitos ainda insistem em não querer enxergar, a pouca frequência com que vãoacontecendo.
Embora de lamentareventuais tentativas de agressão – que alegadamente possam ter existido –compreendem-se as razões dos protestos e da exaltação de alguns ânimos. O desesperonão é, por norma, bom conselheiro e é perfeitamente natural que à medida queformos empobrecendo mais desesperados façam coisas que em situações normais nãofariam.
O que nunca me pareceunormal é que estes indignados – provavelmente alguns deles profissionais daindignação, não sejamos ingénuos – apareçam apenas depois das asneiras que estamosa pagar já estarem feitas. Não teria sido má ideia terem insultado, na ocasião,quem andou de terra em terra a anunciar as obras faraónicas que agora nos estãoa custar os olhos da cara. Assim de repente, mas admito que até possa ser daminha memória, não me lembro de nenhuma manifestação contra a construção dosestádios de futebol, de auto estradas onde ninguém passa, de infra-estruturasque não servem para nada e que apenas foram construídas para “aproveitar” – queexpressão fantástica! – fundos comunitários ou contra as exorbitâncias pagasaos cantantes Carreiras desta vida. Desconfio– ando há dez anos a escrever isto – que os nossos problemas começaram aí. Ou,pelo menos, agudizaram-se desde então.

Amanhã continuarão com um nivel de patriotismo tão elevado como ontem?

Kruzes Kanhoto, 28.06.12

Pode ser apenas impressãominha mas, eu que tenho o mau costume de prestar atenção aos pormenores, há umassemanas que não leio nem ouço a irritante expressão “é o país que temos...” apropósito de tudo e de nada. Seja lá o que for que os autores do desabafopretendam insinuar quando a escrevem ou pronunciam. Deve ser, desconfio, dopatrioteiro intervalo que os tugas fizeram para mostrar o seu amor à pátria. Coisaque, como se sabe, gostam de exibir de dois em dois anos durante o curto períodode tempo em que a selecção de futebol está em competição.
Ao contrário de muitagente, a maioria da qual percebe tanto de futebol como eu percebo de cozinha afegã,não nutro grande entusiasmo pela selecção nacional do pontapé na bola. Porvárias razões. Nomeadamente o massacre noticioso a que, nestas ocasiões, sousujeito. Não se pode ligar uma televisão sem que o objecto da notícia seja a “equipade todos nós”. Dados fundamentais para a boa prestação da equipa são reveladosem catadupa. Desde a marca dos carros dos jogadores até ao nome da loja ondecompram as cuecas, de tudo fomos informados para que, na altura do jogo, pudéssemosavaliar correctamente o seu desempenho dentro de campo. Pelo menos para aquelesque ainda tivessem paciência de, sequer, ouvir falar de selecção. É que, nãosei se os gajos da comunicação social sabem disso, tudo o que é demais chateiae provoca em muitas circunstâncias o efeito contrário.
Foi, por isso, com algum alívioque vi aquele indivíduo de aspecto pouco recomendável, caceteiro inveterado eque, no relvado, dá porrada em toda a gente que use uma camisola diferente dasua, acertar em cheio na barra da baliza defendida pelo espanhol. Para além da magníficapontaria demonstrada, teve o mérito de nos poupar à continuação do espectáculo deprimentede gente que nunca fez nada pelo país - a não ser viver à conta dele e deixarimundos os locais públicos onde assistiu aos jogos - garantir que Portugal é omaior. E o que temos, também.

Nem estou em mim...

Kruzes Kanhoto, 26.06.12

Hoje consumou-se mais umassalto. Desta vez gamaram-me, como há muito tinham anunciado, o subsídio deférias. O que, à semelhança do que acontecerá com todas as vítimas deste bandodevidamente organizado que dá pela alcunha de “governo”, me faz sentir indignado.Capaz, digamos, de chamar nomes até esgotar o repertório mais vernáculo, aos políticos,aos eleitores e outros sabujos que contribuíram para este esbulho de que acabode ser alvo. E, até, inventar ainda mais uns quantos. Mas não o vou fazer. Nadaresolvia. Nem, sequer, contribuía para diminuir o nível de irritação.
Ser assaltado é sempremau. Sê-lo duas vezes é pior ainda. Principalmente quando isso ocorre no mesmodia. É, convenhamos, algo para deixar qualquer um fora de si. Pois que foi omeu caso. Fui duas vezes assaltado hoje e fiquei fora de mim. E ainda nãoregressei. Quis o destino, ou outro palhaço qualquer, que no mesmíssimo dia em quenão recebi o subsídio de férias que me é devido, tivesse na caixa do correiouma notificação das finanças a comunicar-me a avaliação da casa. Coisa para, nopróximo ano, ver multiplicar por cinco o valor a pagar de IMI.  
Tenho, por isso, mais doque razão para estar “ligeiramente” chateado. Aborrecido, vá. Não que meincomode pagar impostos. O que me desagrada – e inquieta, também - é o quefazem com eles.


Os javardos que paguem a crise

Kruzes Kanhoto, 24.06.12

Tem-se falado, com algumainsistência nos últimos dias, da eventual necessidade de novas medidas deausteridade face à má execução orçamental do ano em curso. Nomeadamente e comoseria de esperar pela significativa quebra nas receitas fiscais. Do que se temfalado muito pouco é daquelas que terão mesmo de ser aplicadas por causa das dívidasdas autarquias. Vá lá saber-se porquê essas parecem não afligir oscomentadores, os políticos, nem – pasme-se – a população que as vai pagar. Ebem pagas, acrescente-se.
O Plano de Apoio àEconomia Local, recentemente objecto de acordo entre o governo e ANMP, prevê,entre outras coisas, um aumento significativo das receitas municipais dasautarquias que recorram ao financiamento estatal para satisfazer os seusencargos para com os credores. E, embora a adesão seja voluntária, perante osmais patéticos constrangimentos legislativos que foram criados, praticamentetodas terão de o fazer sob pena de, não recorrendo ao PAEL, verem toda a suaactividade bloqueada ou os seus responsáveis incorrerem em responsabilidadecriminal.
Neste contexto não seráde admirar que os preços dos bens e serviços das autarquias soframactualizações capazes de nos pôr – àqueles que os têm – os cabelos em pé. A água,o IMI ou o selo do carro serão apenas alguns, mas tudo o resto irá pelo mesmocaminho. Tudo o resto é como quem diz. Provavelmente coimas que penalizemcomportamentos como este, perpetrado por um vizinho javardão e filho da puta,continuarão incólumes. O que é pena. Se os donos dos descomunais montes demerda que pululam pelos passeios das nossas vilas e cidades fossem devidamentetaxados a crise passaria rapidamente à história.  

As barbas do vizinho já estão a arder...

Kruzes Kanhoto, 23.06.12

Queixam-se osresponsáveis pelas instituições de solidariedade social, de certeza absolutacom toda a razão, da falta de meios para apoiar quem a elas se dirige em buscade auxílio. Neste, como noutros campos, os recursos são quase sempre escassose, infelizmente, por maior que seja a boa vontade de quem está à frente destasorganizações, acredito que é difícil satisfazer todas as solicitações que lhessão dirigidas. Não será mesmo de excluir que, com o agudizar da crise e ocolapso social a que estamos a assistir, alguns destes organismos possam,também eles, entrar em ruptura.
Passei um destes dias porperto de um dos locais onde cá pelo burgo é distribuída ajuda alimentar. Aoscidadãos mais carenciados, suponho. E, confesso, fiquei incomodado. Se a crisee a tragédia para onde fomos conduzidos não constituem motivo de grandesurpresa, a sua dimensão – essa sim – mais do que apreensivo, começa a deixar-meassustado.
Vou poupar-me ao trabalhode percorrer o caminho da demagogia. Esqueço, por isso, o facto de um ou outroque dali saía com ajuda alimentar ser cliente assíduo das esquinas e tascos dacidade, onde fuma as suas cigarradas ou emborca umas bejecas. Não virá, daí,grande mal ao mundo e um homem – ou uma mulher – ainda que pobre, também tem direitoaos seus pequenos prazeres. Mas não consigo ficar indiferente quando umaposentado da função pública, com mais de oitocentos euros mensais de reforma,sente necessidade de recorrer a uma instituição para obter bens alimentaresessenciais. Aí é porque a crise já está a bater bem fundo. Será, portanto,tempo de todos nós irmos colocando as barbas de molho não vão elas, um dia destes,pegar fogo.

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