Não sei o que causa tanta indignação nasdeclarações proferidas por um corretor inglês - que afinal, sabe-se agora, não o era - numa entrevista televisiva onde afirmou estar radiante com a actual crise porque, ao que garantiu, lhe está apermitir auferir elevados proveitos. Qualquer corretor dos verdadeiros, se quisesse ser sincero, diria exactamente a mesma coisa. Não é desonestidade nenhuma e, nesta como em noutras profissões em que tal é possível, ganhar muito dinheiro revela elevada competênciaprofissional. Pena que a esmagadora maioria diabolize o lucro e dirija a suafúria na direcção errada.
Vejamos este pequeníssimo e quase insignificanteexemplo. Numa qualquer localidade, mesmo daquelas onde a maioria dos escassoshabitantes está com os pés para a cova, construiu-se uma piscina, um pavilhãodesportivo onde se podem praticar todas as modalidades e mais algumas, dotou-seo campo de futebol lá do sítio de um relvado todo janota, fizeram-se estradas que vão de nenhures a lado nenhum e edificaram-se duasou três escolas todas catitas e modernaças. Isto apesar de quase não nasceremcrianças lá na terra e de idênticos equipamentos existirem já em todas as localidades vizinhas. Tudo somado é coisa para vinte milhões de eurosfinanciados a oitenta por cento. O que, para os decisores, se afigura como umnegócio fantástico. Ou soberbo, na opinião dos eleitores inebriados com tantodinamismo. Claro que o insignificante pormenor de ainda faltarem quatro milhõesé apenas um miserável detalhe, só invocado pela falta de visão estratégica deuns quantos parvos. Até porque, como é óbvio, a banca estava mesmo desejosa definanciar a parte do investimento que os fundos europeus não cobriam. Apesar de,também ela tal como o país, não ter dinheiro e, por consequência, necessitar derecorrer aos mercados.
Ora, como é suposto saber-se, estas coisaspagam-se. E quando alguma coisa se paga alguém ganha alguma coisa. E é aqui queos tais corretores, insensíveis e gananciosos, entram em acção. Embora, que se saiba, nunca tenham posto os andantes na tal terriola perdida onde já não nascem crianças.Nem precisam. O melhor é mesmo não aparecerem por lá. Nessa terra – e nas outrastodas também – as pessoas não gostam de quem ganha dinheiro. Apreciam muitomais quem o gasta.